A questão étnico-racial no Brasil[1].
SOARES, Marilda
O Brasil é um país que se
caracteriza pela diversidade e formação multiétnica.
Assim, os valores éticos e as
atitudes positivas frente à multiplicidade de manifestações culturais, étnicas,
humanas e de solidariedade devem estar entre as prioridades do processo
educativo e do projeto político nacional.
Pensando nas demandas dos grupos
afrodescendentes do Brasil, embora algumas conquistas já estejam presentes em
políticas afirmativas e reparadoras, ainda há um caminho a trilhar e muitas
barreiras a vencer.
Quando libertos tornaram-se legalmente livres, no entanto, não houve nenhum tipo de preocupação ou medida política que oferecesse garantias para o cumprimento da Lei. Ao contrário, a mentalidade escravagista somada à indignação contra a desestruturação do modelo econômico, e as consequentes perdas de investimentos, fizeram com que surgisse, inclusive, o grupo dos chamados “Republicanos de 14 de maio”, indicando que muitos dos monarquistas estavam aderindo à causa republicana como forma de repúdio ao “13 de Maio”.
As Constituições do Brasil
afirmaram a igualdade, porém não foram instrumentos eficazes para combater a
desigualdade e a exclusão.
A primeira, de 1824 afirmava: “A Lei será igual para todos, quer proteja,
quer castigue, e recompensará em proporção dos merecimentos de cada um”
(Art.179). Porém, a escravidão foi mantida, durante todo o Império, como modelo
econômico e social. Ora! É impossível a coexistência entre igualdade e
escravidão.
A Abolição da
escravatura viria apenas no final do século XIX, após intensa pressão externa,
da campanha inglesa pelo fim do tráfico negreiro, e interna, do movimento
abolicionista. E, como resultado, algumas leis antecederam a Lei Áurea: Lei
Feijó, Lei Eusébio de Queirós, Lei do Ventre Livre e Lei do Sexagenário.
Contudo, não lograram estabelecer práticas sociais mais igualitárias.
Com a República,
novas leis entraram em vigor. É importante destacar que os textos
constitucionais, que regulam a vida política e social afirmaram, sempre, o
princípio da igualdade perante as leis, sem privilégios ou distinções por
motivo de nascimento, sexo, raça, profissões, crenças religiosas ou ideias
políticas.
Contudo, havia
vozes contrárias à igualdade étnico-racial. Por exemplo, o Decreto-lei
7.967/45, no Art. 2º, definia critérios para a entrada de imigrantes:
“Atender-se-á, na admissão de imigrantes, à necessidade de preservar e
desenvolver, na composição étnica da população, as características mais
convenientes da sua ascendência europeia”. Essa é uma mostra da permanência da
mentalidade excludente e da política de branqueamento, que pensava na
diminuição da mestiçagem africana e indígena e idealizava o brasileiro apenas como
descendente europeu.
Já no final do
século XX, em 1981, foi proclamada pela Assembleia Geral da ONU a Declaração
sobre a Eliminação de Todas as Formas de Intolerância e Discriminação Fundadas
na Religião ou Convicções. Esse documento baseia-se nos princípios da dignidade
e da igualdade próprias de todos os seres humanos, tinha por objetivo firmar o
compromisso dos países-membros da Organização das Nações Unidas, da qual o
Brasil faz parte, para estimular o respeito universal e efetivo dos direitos
humanos e as liberdades fundamentais de todos, sem distinção de raça, sexo,
idioma ou religião.
Também de acordo
com esses mesmos princípios, a Constituição brasileira de 1988 afirma que: “A lei punirá qualquer discriminação
atentatória dos direitos e liberdades fundamentais”... “A prática do racismo constitui crime
inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei”.
Nesse século XXI,
o destaque está na política afirmativa, em medidas como a Lei 10.639/2003
(ensino de História da África e dos povos afrodescendentes) e a criação da
SEPPIR, a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, em 2003; o
Estatuto da Igualdade Racial, de 2010, “destinado a garantir à população negra a efetivação da
igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos individuais,
coletivos e difusos e o combate à discriminação e às demais formas de
intolerância étnica” (Art.1º). Assim como os
Conselhos Municipais para efetivação de políticas públicas igualitárias, como é
o caso do CONEPIR, o Conselho da Comunidade Negra de Piracicaba.
Em 2013 estão sendo realizadas
Conferências para debater essas questões. Em novembro próximo, as demandas da
sociedade serão apresentadas na III Conferência Nacional de Promoção da
Igualdade Racial, que terá como temática “Democracia
e Desenvolvimento por um Brasil Afirmativo”. A expectativa é englobar as
propostas que emergirem dos diferentes grupos étnicos, para que se possa,
então, ter ciência das necessidades sentidas e estabelecer metas para a
aplicação de uma política efetiva de combate ao racismo, à xenofobia e à
desigualdade étnico-racial.
Que assim seja!